Uma pessoa pública, ciente do seu dever de cuidar dos seus concidadãos, numa sua manifestação, levada online ao ar, expressou sua convicção de que nossa necessária conduta nesta situação pandêmica atual, deve ser de racionalidade e solidariedade. Nesse binômio sintético de racionalidade e solidariedade, expresso por essa pessoa pública, tem muito de sabedoria. Trata-se de sermos racionais e solidários - feliz e necessária conduta.
A racionalidade mexe com a nossa razão. A solidariedade mexe com o nosso coração. Razão e coração devem andar juntos: uma razão cardíaca e um coração racional. Assim como “a ciência e a fé, longe de se oporem, são duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade”, como afirmou São João Paulo II, também a razão e o coração não se opõem e são duas condutas para termos uma existência pessoal e social sadias, tanto mais, quando o coronavírus ameaça a saúde de nossa civilização humana (aqui a saúde é entendida no sentido físico, mas também no sentido ontológico do ser pessoal e do conviver social).
Duas figuras bíblicas podem ser aqui evocadas e nelas percebermos as duas condutas: a racionalidade e a solidariedade.
Para a racionalidade temos o apóstolo Tomé. O episódio que narra o encontro dele com o Senhor Ressuscitado mostra bem a sua racionalidade. Descreve o evangelista João, que no primeiro dia da semana, o Senhor Ressuscitado aparece aos discípulos reunidos. Jesus aproxima-se e dirige-se a Tomé e diz: “Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão, coloca-a no meu lado”. Tomé racionalmente queria verificação e comprovação. E o Senhor Ressuscitado lhe oferece essa verificação e essa comprovação; satisfaz a razão do apóstolo, dom do Criador, que quer ver e comprovar. E Tomé, diante disso, faz cardiacamente uma profissão de fé: “Meu Senhor e meu Deus!”. A razão de Tomé tornou-se cardíaca.
Para a solidariedade temos o apóstolo João. Na crucificação de Jesus de Nazaré, estava ele de pé, com a sua mãe, Maria, e outras mulheres, junto à cruz. Mostra a solidariedade do apóstolo com a mãe de Jesus e com o Filho dela e seu mestre. E Jesus, tendo presente essa solidariedade, faz o grande dom à humanidade de entregar a sua mãe a João como seu representante: ”Eis a tua mãe”. E João, diante disso, soube racionalmente assumir, em nome do gênero humano, a maternidade de Maria: “A partir daquela hora, o discípulo a acolheu em sua casa”. O coração de João tornou-se racional.
Nesta situação pandêmica precisamos, sim, racionalidade e solidariedade; precisamos razão e coração andando juntos. Que nossa razão seja cardíaca e nosso coração racional. Assim, seremos capazes de enfrentar a pandemia e sairemos fortalecidos como humanidade.
Dom Jacinto Bergmann,
Arcebispo Metropolitano da Igreja Católica de Pelotas