No domingo passado, participando de um encontro online com um grupo de jovens de Brasília, capital do país, num dado momento, no contexto da momentânea reflexão, uma jovem afirmou: "Não faça da graça uma desgraça". Logo me veio a questão: "Quais são as principais graças que podem tornar-se desgraças?" Essa pergunta pertinente ficou martelando a minha consciência. Ensaio aqui uma primeira resposta.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da fé, uma virtude teologal (vem de Deus). Basta ver tantas pessoas sem rumo certo: ora vão para cá e ora vão para lá! Só a graça da fé que leva ao caminho certo, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da esperança, outra virtude teologal. É só ver tantas pessoas sem uma verdade segura: ora se agarrando numa mentira e ora noutra. Só a graça da esperança que leva a verdade segura, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça do amor, a maior virtude teologal. É doloroso ver tantas pessoas sem vida plena: ora inclinando seu coração para paixões desregradas, ora trocando-as para outras. Só a graça do amor que leva à vida plena, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da verdade, uma virtude evangélica (vem do Evangelho). Basta ver tantas pessoas agarradas em constantes mentiras ilusórias e enganadoras. Só a graça da verdade que leva a uma identidade correta, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da justiça, outra virtude evangélica. É só ver tantas pessoas praticando injustiça tanto pessoal, familiar e social. Só a graça da justiça que leva à uma integridade segura, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da paz, mais uma virtude evangélica. É doloroso ver tantas pessoas enterradas em conflitos consigo mesmo, com os outros e com toda a criação. Só a graça da paz que leva a uma plenitude feliz, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da gratuidade, uma virtude pessoal (é da pessoa). Basta ver tantas pessoas vivendo por interesses egoístas e mesquinhos. Só a graça da gratuidade que leva a pessoa ser "imagem (ser igual) de Deus”, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da alteridade, outra virtude pessoal. É só ver tantas pessoas girando em torno do seu ego e não enxergando os outros. Só a graça da alteridade que leva a ser "semelhança (agir igual) de Deus”, nunca será uma desgraça.
É uma desgraça não acolher e viver a graça da vida, a maior graça pessoal. É doloroso ver tantas pessoas perdendo a sua vida em coisas tão fúteis, passageiras e mortais. Só a graça da vida que leva a ser "transparência (espelhar igual) de Deus”, nunca será uma desgraça.
Obrigado, querida jovem, que me fez ver que é necessário "não fazer da graça uma desgraça".
Dom Jacinto Bergmann, Arcebispo Metropolitano da Igreja Católica de Pelotas