Novo boletim do Grupo Interdisciplinar de Trabalho e Estudos Criminais-Penitenciários (GITEP) da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) analisa os termos e autos de todas as audiências de custódia realizadas no ano de 2022 pelas varas criminais, pela Vara da Violência Doméstica, e pelo Juízo do Plantão na comarca de Pelotas. A amostra totalizou 700 termos e laudos.
Este primeiro boletim apresenta parte dos resultados obtidos mediante pesquisa empírica quanti-qualitativa. O estudo teve como finalidade analisar o impacto do instituto das audiências de custódia nas decisões sobre a condição de liberdade dos cidadãos detidos em decorrência de prisão em flagrante e de prisão cautelar. Dados sobre violência policial na região também foram escopo do estudo.
Atrelada ao Programa de Pós-Graduação em Política Social e Direitos Humanos (PPGPSDH) e Curso de Graduação em Direito da UCPel, a investigação foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS). A produção do estudo é de responsabilidade do docente da UCPel, Felipe Lazzari da Silveira, e utilizou dados estatísticos do Sistema Penitenciário da Secretaria Nacional de Políticas Penais (SISDEPEN/DEPEN).
O instituto de audiência de custódia foi implementado em 2015 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sendo disciplinado pela Resolução nº 213/2015 do mesmo órgão. Tais audiências consistem em uma apresentação da pessoa que foi presa ao juiz. O magistrado, assim, pode ter uma apreciação mais precisa do caso — particularmente das circunstâncias da prisão e das condições pessoais do acusado, permitindo uma redução na quantidade de encarceramentos provisórios desnecessários privilegiando a liberdade ou a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares mais brandas.
O procedimento a ser realizado em casos de prisão em flagrante e de prisão por mandado é composto de dois momentos, constata o boletim. Primeiramente há uma entrevista do custodiado, que deve ter todos os seus direitos e garantias processuais respeitados. Ao final da prática o juiz deve decidir se restitui a liberdade plena; a liberdade cumulada com medidas cautelares diversas da prisão; ou se decreta/mantém a prisão preventiva.
Crimes ditos “de rua” — tráfico de drogas, roubo, furto, entre outros — estão entre os que causam um maior número de encarceramento no país, conforme evidencia o boletim. A pesquisa informa que estas práticas são normalmente atribuídas a indivíduos estereotipados como “inimigos”.
Tais modalidades de crime são as que mais preocupam e causam medo à população. Por consequência, estes delitos mobilizam a classe política, os agentes estatais e influenciam na elaboração das políticas criminais, destaca a pesquisa.
Outro dado relevante apontado é o aumento da decretação ou manutenção de prisões preventivas. Apesar do índice de presos provisórios ter diminuído no último ano, tanto no Brasil, quanto em Pelotas as decretações/manutenções de prisão preventiva superam a média histórica de 30% — já considerada elevada pela publicação.
Inibir e viabilizar a identificação de violência praticada por agentes da força de segurança pública também é uma finalidade das audiências de custódia. A análise expõe que mais de 20% dos custodiados relataram ter sofrido agressões por parte dos agentes. Número que corrobora com as elevadas taxas de violência policial constatadas por estudos no Brasil. O estudo ressalta que as audiências de custódia identificam os casos possíveis maus-tratos e tortura, mas apuração do fato ou a responsabilização dos agentes, sendo essa responsabilidade dos órgãos competentes.
Ainda de acordo com a pesquisa demonstrar empiricamente o impacto da audiência de custódia nos casos estudados não é tarefa simples, visto que o SISDEPEN ainda é recente e conta com poucos dados consolidados. Mesmo assim, o GITEP seguirá acompanhando o impacto do instituto da audiência de custódia. Mais boletins sobre o tema serão disponibilizados pelo grupo. Acompanhe os próximos boletins no site do GITEP.