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Encarceramento feminino é foco de pesquisa inédita divulgada pela Católica
15.07.2008 | 00:00
Encarceramento feminino é foco de pesquisa inédita divulgada pela Católica

Representantes de instituições de execução penal, da comunidade acadêmica e da imprensa local participaram, na tarde desta terça-feira (15), da divulgação dos dados apurados na pesquisa “A prisão dentro da prisão – Uma visão sobre o encarceramento feminino na 5ª região penitenciária do Rio Grande do Sul”. De caráter inédito no Brasil e realizado pelo Grupo Interdisciplinar de Trabalho e Estudos Criminais-Penitenciários da Universidade Católica de Pelotas (Gitep/UCPel), o trabalho mostrou a realidade da difícil adaptação de detentas em estabelecimentos prisionais construídos e dirigidos para presos do sexo masculino.

Entre março de 2006 e fevereiro de 2008, foram feitas coletas de dados sócio-demográficos e jurídico-penais e entrevistas com apenadas dos presídios de Pelotas, Rio Grande, Camaquã e Santa Vitória do Palmar. Neste ínterim, a equipe do Gitep apurou que o atendimento às peculiaridades femininas não é realizado satisfatoriamente. “As distinções em termos de espaços físicos são o elemento mais imediatamente sensível do se estar num presídio masculino, no qual ser mulher é ficar num último plano, simbólico e concreto”, explicou o coordenador do projeto, professor Luís Antônio Bogo Chies.

De acordo com ele, uma das conclusões destacadas do estudo é no sentido de que não há presídios mistos na 5ª região penitenciária do Estado. “Existem, na mais positiva das interpretações, presídios masculinamente mistos. Aqui no Rio Grande do Sul, as mulheres estão presas em presídios de homens; na prisão dentro da prisão”, completou.

Fatores subjetivos
A afirmação de Chies foi comprovada pela declaração das próprias detentas. “Só tem uma cela para as moças que estão aqui e o resto é tudo para os homens”, disse uma delas. “Nós somos as últimas a ser servidas. A comida começa lá na ponta da galeria e a raspa da panela é nossa”, comentou outra.

Todavia, mesmo com os claros indícios de distinção pelo espaço físico desprivilegiado que recebem, as apenadas demonstram posição de conformismo com a situação cada vez mais agravada nestas instituições. Predominantemente jovens, mães, chefes de família, com baixa escolaridade e com trabalho vinculado ao espaço doméstico, elas consideram que não foram “boas mulheres” na chamada sociedade livre. “Elas encaram isso como castigo e naturalizam a culpa, se dispondo a sofrer o que tiver de sofrer lá dentro, por não terem se adaptado fora”, disse o acadêmico do oitavo semestre de Direito da UCPel, Jackson Leal. “Ouvi a expressão ‘eu sempre fui a ovelha negra da família’ como justificativa para isso, várias vezes durante as entrevistas”.

Para o representante da 5ª Delegacia Penitenciária, Nasser Almeida, a constatação dos danos emocionais que a falta de uma boa estrutura prisional causa às apenadas foi o ponto alto dos resultados do estudo. “Trabalhando lá dentro fica fácil perceber que o espaço físico é um problema grave. Quem está dentro, vê isso claramente. Mas a questão da subjetividade me surpreendeu”, destacou. O fato de as presas terem de sair das suas celas para visitar seus companheiros presos é um fator que denota inferiorização, assim como o problema da falta de atendimento médico. Muitas delas demonstram uma baixa auto-estima ao explicarem esta falha com frases do tipo: “Se nem os homens são atendidos, quanto mais nós. Não podemos adoecer. Esta é que a verdade”.

Da teoria à prática
Para a agente penitenciária de Canguçu, Valderez Ferreira, a expectativa é de que a pesquisa sirva como base para mudanças palpáveis na estrutura carcerária da região. “Como funcionário, a gente vê que só é possível fazer alguma coisa que mude a situação se as prisões forem construídas em lugares menores. É preciso acabar com esta idéia de que agrupando cada vez mais gente num mesmo lugar se economiza. Desse jeito, não tem como haver ressocialização”.

“Nossa intenção enquanto Academia não é denunciar, mas desvelar alguns pontos críticos que acabam se perdendo com a banalização ou não são vistos”, concordou Chies.

Equipe
Além do coordenador, participaram da pesquisa os professores Marcelo Moura (Direito), Ana Luisa Barros (Serviço Social), Leni Beatriz Colares (Sociologia), Carmem Lúcia Lopes e Sinara de Oliveira (Psicologia) e os voluntários e bolsistas de iniciação científica (PIC/UCPel) Alexandro Correa, Ana Caroline Jardim, Cátia Schmidt, Gabriel Espiga, Jackson Leal, Josiane Espanton e Sabrina Paz.

O estudo contou com o fomento de recursos financeiros do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da UCPel.

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