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[Convite à Reflexão] - Capelania UCPel
30.04.2014 | 14:01 | #capelania-e-identidade-crista
[Convite à Reflexão] - Capelania UCPel
Estamos no tempo litúrgico da Páscoa. Isso nos enseja refletir sobre a Ressurreição, a de Jesus e a nossa (a plenificação definitiva da Vida em Deus, eternidade adentro), bem como sobre a dinâmica de Vida Nova aberta pelo Ressuscitado já neste mundo. A Ressurreição é dom a ser acolhido na Fé e é missão a ser vivida na Esperança (colaborar para que haja mais Vida na História humana, especialmente para as pessoas em que a existência está mais ferida e ameaçada  -  os Pobres de Deus!



Oferecemos dois textos que se complementam: um teológico (entrevista com Andrés Torres Queiruga), para subsidiar a compreensão crítica e amadurecida da Fé na Ressurreição); outro pastoral, exortativo, catequético (homilia pascal do papa Francisco), para ajudar que ressoe mais forte no coração dos fiéis a mensagem do Evangelho, boa notícia de Vida nova e abundante para todos os filhos e filhas de Deus.

Boa leitura! Boa reflexão!


A surdez humana e a voz infinita de Deus
(entrevista especial com Andrés Torres Queiruga)



“Não houve ‘silêncio de Deus’ em Auschwitz”, e a pergunta “Onde está Deus?”, que voltou a ser feita após o holocausto, deve ser “enterrada definitivamente”, enfatiza Andrés Queiruga na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail. O que houve, assinala, foi ‘surdez humana’, porque Deus “sempre está clamando com ‘voz infinita’”. Na avaliação do teólogo, perguntas que apontam para o silêncio de Deus diante da maldade humana e sugerem o consentimento de Deus diante das atrocidades “levam diretamente ao ateísmo”, e uma “teologia não devidamente atualizada pode ter resultados catastróficos”.

Para ele, é preciso compreender que os casos de brutalidade foram cometidos “identicamente contra as vítimas e contra Deus”, e que o “mal é algo que Deus não quer e contra o qual, desde o começo da história, está do nosso lado, chamando-nos para que colaboremos com Ele, para remediá-lo ou diminuí-lo na medida do possível”. O que não se pode fazer, acrescenta, “diante do horror de Auschwitz, dos gulags, dos campos de extermínio, dos genocídios e das crianças mortas de fome, é continuar perguntando: por que, Senhor, estás calado, por que consentes isto?”

Andrés Torres Queiruga é professor da Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha. É licenciado em Filosofia e Teologia pela Universidade de Comillas, Espanha, doutor em Filosofia pela Universidade de Santiago de Compostela, Espanha, e doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana, Itália. Entre suas obras publicadas em português, citamos Creio em Deus Pai. O Deus de Jesus como afirmação plena do humano (São Paulo: Paulinas, 1993); O cristianismo no mundo de hoje (São Paulo: Paulus, 1994); A revelação de Deus na realização humana (São Paulo: Paulus, 1995); e Repensar a ressurreição (São Paulo: Edições Paulinas, 2004). No livro A teologia na universidade contemporânea, publicado pela Editora Unisinos, 2005, Queiruga é autor do artigo A teologia a partir da modernidade.

IHU On-Line - Como o senhor lê a passagem do evangelho de Marcos 16, 1-8, em especial quando se diz que Jesus ressuscitou e os precede na Galileia?

Andrés Torres Queiruga - Era, com muita probabilidade, o final do Evangelho primitivo. Passagem um tanto misteriosa, cheia de alusões e aberta ao mistério. Em todo o caso, testemunha a fé na ressurreição como firmemente presente na comunidade quando se escreve o Evangelho. A indicação da Galileia alude à missão e ao papel de Pedro e dos apóstolos. A interpretação desta passagem só é possível no conjunto dos Evangelhos e das Cartas de Paulo.

IHU On-Line - Quais são as suas pesquisas teológicas atuais no que diz respeito à questão da ressurreição?

Andrés Torres Queiruga - Expliquei-as longamente no livro “Repensar a ressurreição”. Fazer um breve resumo levaria seguramente a equívocos sobre a interpretação que proponho. Prefiro limitar-me a indicar as preocupações e alguns resultados.
1) O núcleo do que a palavra ressurreição quer dizer é um comum religioso, não no sentido de que pertence a todas as religiões, pois todas  -  mesmo o budismo  -  afirmam que a nossa vida não é aniquilada pela morte.
2) Jesus e os discípulos, assim como a maioria dos seus contemporâneos judeus, já acreditavam na ressurreição e rezavam cada dia ao “Deus que ressuscita os mortos”.
3) No Antigo Testamento, a revelação da ressurreição não aconteceu mediante provas empíricas ou milagrosas, como aparições ou sepulturas vazias; mas pela confiança no amor de Deus e na sua fidelidade inquebrantável, que não pode consentir que os seus filhos e filhas sejam aniquilados pela morte; compreenderam-no sobretudo no caso do martírio, como aparece nos irmãos Macabeus, davam a vida pela fé.
4) Havia também a convicção difusa de que algumas pessoas, como os grandes Patriarcas, podiam estar vivas depois da sua morte; inclusive o Batista, contemporâneo de Jesus.
5) A dramatização apologética de que os apóstolos traíram Jesus e perderam a fé nele, para assim demonstrar que teve que haver “provas empíricas” da ressurreição, não pode ser certa: nem psicologicamente nem historicamente os seguidores abandonam o líder quando morre em fidelidade à sua missão: não o fizeram os discípulos de Batista, naquela época, nem os seguidores de monsenhor Romero, hoje; nem, muito menos, os discípulos de Jesus, que abandonaram tudo para segui-lo e que o viram morrer pela fidelidade ao Pai e por amor aos outros.
6) Justamente por isso, penso que a cruz, com a sua de outra maneira incompreensível experiência de contraste, foi o motivo fundamental para os apóstolos se darem conta, ou seja, terem a revelação de que Jesus estava vivo: “Deus não podia permitir que o seu Santo visse a corrupção”.
7) A isto puderam somar-se outros motivos, sobretudo a meditação da Escritura e a celebração da Eucaristia, como aparece na maravilhosa catequese dos discípulos de Emaús (note-se que não se faz referência a aparições nem ao sepulcro vazio); também, provavelmente, pode ajudar a sensação psicológica da presença, tão comum sobretudo entre as mulheres, quando morre um ser muito querido...

Para mim, o principal deste modo de ver são as consequências teológicas e espirituais.
1) Assim pode-se compreender que a ressurreição acontece já na morte. Jesus morre para dentro de Deus: “nas tuas mãos coloco a minha vida”, diz o Evangelho de Lucas.
2) Aí reside a grande novidade que a ressurreição de Jesus introduz na revelação do comum religioso. Fica claro que a ressurreição acontece já, acontece plenamente e acontece como glorificação, isto é, como introdução na plenitude de Deus e, portanto, como presença na comunidade e na história a partir dessa plenitude salvadora.
Então fica clara a aplicação a nós: no mistério de Jesus revela-se, como disse o Vaticano II, também o nosso mistério.
1) Também para nós, morrer é ressuscitar, entregar a vida nos braços do Pai.
2) Em consequência, nos damos conta de que é isso que Deus foi fazendo desde a criação do mundo: que sentido teria o “Deus de vivos e não de mortos” esperar centenas de milhares de anos para começar a ressuscitar as suas filhas e os seus filhos? E ressuscitar apenas um (e depois também só Maria), para esperar até o fim dos tempos e começar outra vez?
3) Jesus é o “primogênito dos mortos”, não na ordem cronológica, mas como fundamento e pioneiro na plenitude da nossa fé. Para compreender isto, pensemos no que acontece com o Abbá: nunca ninguém falara antes com tanto calor, segurança e confiança de Deus como Pai-Mãe. Mas isso não significa que Deus começasse a ser Abbá apenas nos primeiros anos da nossa era: mas que em Jesus se revela plenamente o que Deus estava sendo desde sempre, pois o seu amor é idêntico e sem discriminação com todos os seus filhos e filhas: para os da pré-história mais remota, assim como para os do futuro mais distante.
4) A comunhão dos santos — e confesso que esta foi para mim uma grande e gozosa descoberta — adquire assim um relevo gozoso, e a liturgia funerária ilumina-se pensando que em cada caso celebramos, como no caso de Jesus, a morte e a ressurreição da nossa irmã ou do nosso irmão; podemos sentir-nos em comunhão viva com eles e alimentar a esperança neste grande, embora difícil, mistério da ressurreição.

Compreendo que, expressada dessa maneira, do jeito tão breve e com expressões não tão comuns, esta visão pode surpreender; e a experiência mostra-me que muitas pessoas se escandalizam. Estão no seu direito de discordar e de viverem de outra maneira a compreensão da fé comum. Eu só pediria que antes de tomarem uma postura definitiva, meditem estas ideias e, sobretudo, examinem as consequências para uma fé viva e uma compreensão atualizada e coerente.

IHU On-Line - Como o senhor lê o 2º capítulo da Carta de Paulo aos Filipenses, quando diz que Deus despojou-se tomando a condição de servo, tornando-se homem e se rebaixou tornando-se obediente até a morte, numa cruz? O que significa esse rebaixamento e esvaziamento de Deus representados na condição humana de Jesus e na morte da cruz?

Andrés Torres Queiruga - Tratando-se de um hino, eu tendo a ver aí, acima de tudo, uma expressão teológica — iluminada já pelo que foi a luz gloriosa da ressurreição — do destino e das atitudes de Jesus, que nos revelou onde está a verdadeira grandeza que Deus quer para nós. Não a dominação, mas o serviço; não o dinheiro, mas a pobreza; não buscar ser o primeiro, mas o último.

IHU On-Line - Como entende a interpretação de entrega que envolve a morte de Jesus: O Pai que entrega o Filho, o Filho que se entrega por nós, que é a entrega do Espírito Santo? Qual é a importância dessa entrega?

Andrés Torres Queiruga
- São expressões que têm o seu sentido num “segundo” ou “terceiro” nível de reflexão, enquanto nos falam da total entrega de Jesus à sua morte, do seu ser totalmente fiel e transparente ao impulso — ao Espírito — pelo qual Deus, que nos cria-por-amor, está chamando o nosso ser, buscando a nossa mais autêntica e plena realização. Se não tivermos isso em conta e se tomarmos as frases ao pé da letra, (at face value, como dizem os ingleses), podemos provocar graves mal-entendidos. Porque então, por exemplo, a cruz, que em si — como crime cometido contra um inocente — é um mal terrível e, portanto, algo não querido por Deus, converte-se num bem, isto é, em algo querido e mandado por Deus. A única coisa que Deus quer é que Jesus seja fiel ao seu ser autêntico e ao que compreende como fidelidade à sua missão: que seja fiel apesar das horríveis consequências que — contra o seu desejo, assim como o de Jesus  -  isso lhe podia trazer e lhe trouxe. Por isso, porque esta é uma das consequências perversas da fidelidade humana na luta contra o mal, Jesus continua a ser ânimo e modelo para todas as pessoas que se entregam ao bem.

IHU On-Line - Quais são os grandes desafios de se fazer Teologia depois de Auschwitz?

Andrés Torres Queiruga - O fundamental é compreender que tudo isso aconteceu identicamente contra as vítimas e contra Deus. Que o mal é algo que Deus não quer e contra o qual, desde o começo da história, está do nosso lado, chamando-nos para que colaboremos com Ele, para remediá-lo ou diminuí-lo na medida do possível. Este é o único “mandamento”: que amemos os outros, lutando contra o mal, ou seja, sobretudo contra a opressão do órfão e da viúva, contra a fome e contra toda marginalização ou injustiça. O que não se pode fazer, diante do horror de Auschwitz, dos gulags, dos campos de extermínio, dos genocídios e das crianças mortas de fome, é continuar perguntando: por que, Senhor, estás calado, por que consentes isto? Essas perguntas hoje levam diretamente ao ateísmo. Uma teologia não devidamente atualizada pode ter resultados catastróficos.

IHU On-Line - Como essa Teologia se atualiza na América Latina?

Andrés Torres Queiruga – A Teologia da Libertação, mesmo que em nível teórico nem sempre tenha esclarecido suficientemente estas perguntas, soube fazê-lo no nível prático. Ensinou a todos os outros teólogos que o único modo verdadeiro de crer no Deus anti-mal é colocar-se do lado dos pobres, dos marginalizados e dos oprimidos. A sua mensagem, exatamente porque é tão acertada, convenceu todo o mundo.

IHU On-Line - Que relações podem ser percebidas entre a banalidade do mal, como propõe Hannah Arendt, e o silêncio de Deus em Auschwitz?

Andrés Torres Queiruga - Não houve “silêncio de Deus” em Auschwitz: esse é um ponto que me atrevo a qualificar de blasfemo e que devemos enterrar definitivamente. Deus gritava incansavelmente contra esse crime horrendo na consciência dos criminosos, mas não lhe fizeram caso; e também no coração de todos os outros: nos que, comoEdith Stein, Maximiliano Kolbe, Etty Hillesum e tantos outros acolheram o seu apelo até darem a vida; e nos outros cuja obediência só Ele conhece e pode julgar. Em todo o caso, pode ter havido surdez humana, mas não silêncio do Deus que, segundo São João da Cruz, sempre está clamando com “voz infinita”.

                           (IHU, Notícias Diárias - 21 de abril de 2014)
(Por Patricia Fachin e Márcia Junges – Tradução de André Langer)



Mensagem Urbi et Orbi do papa Francisco - Páscoa de 2014

Amados irmãos e irmãs, boa e santa Páscoa!

Ressoa na Igreja espalhada por todo o mundo o anúncio do anjo às mulheres: «Não tenhais medo. Sei que buscais Jesus, o crucificado; não está aqui, pois ressuscitou [...]. Vinde, vede o lugar onde jazia» ( Mt 28, 5-6).

Este é o ponto culminante do Evangelho, é a Boa Nova por excelência: Jesus, o crucificado, ressuscitou! Este acontecimento está na base da nossa fé e da nossa esperança: se Cristo não tivesse ressuscitado, o cristianismo perderia o seu valor; toda a missão da Igreja via esgotar-se o seu ímpeto, porque dali partiu e sempre parte de novo.

A mensagem que os cristãos levam ao mundo é esta: Jesus, o Amor encarnado, morreu na cruz pelos nossos pecados, mas Deus Pai ressuscitou-O e o fez Senhor da vida e da morte. Em Jesus, o Amor triunfou sobre o ódio, a misericórdia sobre o pecado, o bem sobre o mal, a verdade sobre a mentira, a vida sobre a morte.

Por isso, nós dizemos a todos: «Vinde e vede». Em cada situação humana, marcada pela fragilidade, o pecado e a morte, a Boa Nova não é apenas uma palavra, mas é um testemunho de amor gratuito e fiel: é sair de si mesmo para ir ao encontro do outro, é permanecer junto de quem a vida feriu, é partilhar com quem não tem o necessário, é ficar ao lado de quem está doente, é idoso ou excluído... « Vinde e vede»: o Amor é mais forte, o Amor dá vida, o Amor faz florescer a esperança no deserto.

Com esta jubilosa certeza no coração, hoje nos voltamos para Vós, Senhor ressuscitado!

Ajudai-nos a Vos procurar para que todos Vos possamos encontrar, saber que temos um Pai e não nos sentirmos órfãos; que podemos Vos amar e Vos adorar.
Ajudai-nos a vencer a chaga da fome, agravada pelos conflitos e por um desperdício imenso de que muitas vezes somos cúmplices.

Tornai-nos capazes de proteger os indefesos, sobretudo as crianças, as mulheres e os idosos, por vezes objeto de exploração e de abandono.

Fazei que possamos cuidar dos irmãos atingidos pela epidemia de ebola na Guiné Conacri, Serra Leoa e Libéria, e daqueles que são afetados por tantas outras doenças, que se difundem também pela negligência e a pobreza extrema.

Consolai quantos hoje não podem celebrar a Páscoa com os seus entes queridos porque foram arrancados injustamente dos seus carinhos, como as numerosas pessoas, sacerdotes e leigos, que foram sequestradas em diferentes partes do mundo.

Confortai aqueles que deixaram as suas terras emigrando para lugares onde possam esperar um futuro melhor, viver a própria vida com dignidade e, não raro, professar livremente a sua fé.

Nós vos pedimos, Jesus glorioso, que façais cessar toda a guerra, toda a hostilidade grande ou pequena, antiga ou recente!

Nós vos suplicamos, em particular, pela Síria, a amada Síria, para que quantos sofrem as consequências do conflito possam receber a ajuda humanitária necessária e as partes em causa cessem de usar a força para semear morte, sobretudo contra a população inerme, mas tenham a audácia de negociar a paz, há tanto tempo esperada.

Jesus glorioso, nós Vos pedimos que conforteis as vítimas das violências fratricidas no Iraque e sustenteis as esperanças suscitadas pela retomada das negociações entre israelitas e palestinos.

Nós Vos imploramos que se ponha fim aos combates na República Centro-Africana e que cessem os hediondos ataques terroristas em algumas zonas da Nigéria e as violências no Sudão do Sul.

Nós Vos pedimos que os ânimos se inclinem para a reconciliação e a concórdia fraterna na Venezuela.

Pela vossa Ressurreição, que este ano celebramos juntamente com as Igrejas que seguem o calendário juliano, nós Vos pedimos que ilumine e inspire as iniciativas de pacificação na Ucrânia, para que todas as partes interessadas, apoiadas pela comunidade internacional, possam empreender todo esforço para impedir a violência e construir, num espírito de unidade e diálogo, o futuro do País. Que eles como irmãos possam cantar “Хрhctос Воскрес” [canto oriental de aclamação ao Cristo].

Nós Vos pedimos, Senhor, por todos os povos da terra: Vós que vencestes a morte, dai-nos a vossa Vida, dai-nos a vossa Paz! Queridos irmãos e irmãs, feliz Páscoa!

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