Em uma noite histórica, a Universidade Católica de Pelotas (UCPel) concedeu o título de Doutor Honoris Causa ao professor português, Boaventura de Sousa Santos. A outorga, oferecida em parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), foi realizada na última segunda-feira (04), no Teatro Guarany.
(Clique na imagem para ver mais fotos)
Admiradores e entusiastas do trabalho realizado pelo professor, ao longo de quase meio século de trajetória, acompanharam a cerimônia. Além de homenagens à Boaventura, manifestações artísticas com temáticas sociais complementaram a noite. Na mesa de honra, os reitores da UCPel e da UFPel, os oradores e a prefeita de Pelotas, Paula Mascarenhas.
A abertura da sessão solene foi feita pelo reitor da UCPel, José Carlos Pereira Bachettini Júnior, que destacou a relevância da produção intelectual de Boaventura, assim como o compromisso político e social assumido com as questões da contemporaneidade e a aproximação com o tema dos direitos humanos. “A dignidade é objeto de análise constante do homenageado, que permanentemente nos desafia a pensar a sociedade e os mundos possíveis”, enfatizou Bachettini.
Segundo o reitor da UCPel, a premiação concedida ao professor português é um gesto de agradecimento a contribuição científica e ao incentivo para que a pesquisa acadêmica se volte aos problemas locais. “Ao mesmo tempo, sua obra colabora para a reinvenção política e social do amanhã. Ela nos mostra que precisamos e devemos lutar por um mundo diferente. Basta que não nos conformemos com as injustiças sociais da contemporaneidade e que acreditemos fielmente de que as mudanças são possíveis”, justificou.
O professor Naomar Monteiro de Almeida Filho foi o primeiro orador a falar de Boaventura. Em sua justificativa, destacou os laços antigos e profundos que o sociólogo português mantém com o Brasil. Segundo ele, o título se justifica não somente pela vasta contribuição acadêmica, mas, sobretudo, por seu compromisso com as questões sociais, com os direitos humanos, com os povos oprimidos e por seu ativismo incessante em busca de um mundo mais justo. Almeida Filho ainda destacou a ampla produção acadêmica de Boaventura, com 134 artigos em periódicos científicos, 105 capítulos em coletâneas e 98 livros publicados em sete idiomas.
A segunda exposição foi feita pela professora Regina Nogueira. Emocionada em diversos momentos, falou da afinidade e empatia de Boaventura com questões vivenciadas pelos negros. Para ela, o homenageado expõe a realidade do racismo e da invisibilidade que muitos negros vivem e, através de suas publicações e palestras, se alia a causa e serve de força para quem luta por reconhecimento. “A cor da pele e o lugar que nascemos não nos tornou distantes, abençoado dia que o Boaventura nasceu”, declarou ela.
Já a professora uruguaia Lilian Celiberti, última dos oradores a falar, destacou a habilidade que Boaventura tem de conectar as pessoas com o que elas estão precisando escutar. De acordo com ela, o professor homenageado oferece respostas a grandes perguntas, principalmente sobre desigualdades e relações sociais, sendo essa uma das principais características de um investigador acadêmico.
Finalizando os atos protocolares, o reitor da UFPel, Pedro Rodrigues Curi Hallal, destacou o perfil diferenciado do professor português - acadêmico, ativista e até poeta. Segundo ele, pessoas assim têm o poder de mudar o mundo. “Arrisco dizer que dentro de 500 anos sua obra será estudada e reconhecida”, completou.
Aguardado com ansiedade pelas mais de mil pessoas presentes no Teatro, Boaventura agraciou a todos com a palestra “Democratização da Universidade: construindo alternativas ao capitalismo, colonialismo e patriarcado”. Inicialmente, agradeceu a premiação e falou do privilégio de receber o título em uma cerimônia inédita. “Eu nunca recebi um grau conjunto de duas universidades - uma pública e uma privada - e que tenham se juntado exatamente para me conceder o grau”.
Em sua explanação, falou dos desafios do mundo acadêmico na atualidade. Segundo ele, em muitos países, incluindo o Brasil, tornaram o investimento no futuro e na universidade em um gasto e isso é o primeiro passo para uma luta contra a universidade e, consequentemente, contra o futuro do país. Para ele, as dominações, como o capitalismo, colonialismo e o patriarcado, estão unidas, enquanto a resistência está fragmentada. “A nossa luta deve ser exatamente essa: unir esses movimentos”.
Como uma das principais alternativas ele apontou a busca por uma universidade que reconhece a diversidade epistemológica do mundo, tornando-se uma pluri universidade. Trazer para o mundo universitário os conhecimentos populares, como a sabedoria que existe na sociedade, é um dos meios de alcançar isso. “Não estou contra a ciência, mesmo porque sou um cientista acadêmico e não um sábio, mas é preciso que a ciência reconheça que não é o único conhecimento válido”, enfatizou Boaventura.
Redação: Manuelle Motta