Nesta segunda-feira passada, dia 8 de junho, o texto do Evangelho do dia apresentado pela Igreja à todas as comunidades cristãs dos cinco continentes, versava sobre as “bem-aventuranças” contidas no assim chamado "Sermão da Montanha". Ao debruçar-me sobre o Evangelho proposto perguntei-me: “Como é ser feliz nos tempos de hoje e mui especialmente no tempo da pandemia do coronavírus?”
Normalmente o termo grego "makarioi", que está no texto original, é traduzido por “bem-aventurados”. É uma tradução justa enquanto a compreensão se relaciona com a felicidade incondicional, verdadeira e permanente. Também porque a compreensão do evangelista Mateus, ao usar o termo “makarioi”, está baseada no Salmo 1 do Livro dos Salmos, onde aparece a expressão clássica de felicidade: ashrê haish - "feliz o homem”, aqui homem como pessoa humana.
Assim, o texto evangélico das bem-aventuranças responde à pergunta: “quem são os felizes?” Em oito afirmações de Jesus Cristo, o Salvador da humanidade, temos a verdadeira proposta e um programa seguro de felicidade para as pessoas de todos os tempos e, especialmente, para nós pessoas humanas em meio a uma violenta pandemia que estamos vivendo. O que somos convidados a “valorizar” e qual é a proposta evangélica de felicidade?:
-“Valoriza-se” muito, nos tempos de hoje, o mero “ter mais”… mas felizes são “os pobres de espírito"; “pobreza de espírito” é apostar em Deus, pois ele é Senhor de tudo e de todos; em vez de “ter mais”, trata-se de “ser mais”.
-“ Valoriza-se” muito, nos tempos de hoje, o mero “poder mais”… mas felizes são “os mansos”; “mansidão” é apostar nos outros, pois eles são nossos irmãos e irmãs; em vez de “poder mais”, trata-se de “servir mais”.
- “Valoriza-se” muito, nos tempos de hoje, o mero “aproveitar-se mais”... mas felizes são “os aflitos”; “aflição” é apostar em mim mesmo, não mentira mas com verdade, pois cada pessoa é “imagem e semelhança de Deus”; em vez de “aproveitar-se mais”, trata-se de “amar mais”.
- “Valorizam-se” muito, nos tempos de hoje (levando em consideração as três primeiras bem-aventuranças), os que “têm mais”, os que “podem mais” e os que “se aproveitam mais”... mas felizes são “os que tem fome e sede de justiça”, isto é, “os pobres de espírito”, os “mansos” e os “aflitos”, pois esses são os famintos e sedentos da Justiça.
- “Valoriza-se” muito, nos tempos de hoje, a “competição”... mas felizes são os “misericordiosos”; a “misericórdia” humaniza/diviniza, a “competição” desumaniza;
- “Valoriza-se” muito, nos tempos de hoje, a “falsidade”... mas felizes são os “puros de coração”; a “pureza de coração” fraterniza”, a “falsidade” destrói”;
- “Valoriza-se” muito, nos tempos de hoje, a “prepotência”... mas felizes são os “que promovem a paz”; “a promoção da paz” edifica, “a prepotência” guerreia”.
- “Valorizam-se” muito, nos tempos de hoje (levando novamente em consideração as três bem-aventuranças anteriores), os que “competem mais”, os que “enganam mais” e os que “mandam mais”... mas bem-aventurados os “que são perseguidos por causa da justiça”, isto é, os “misericordiosos”, os “puros de coração” e os “promotores da paz”.
Os que Jesus proclama felizes, são os que vão na contramão da cultura de hoje do “ter mais”, do “poder mais”, do “aproveitar-se mais”, da “competição”, da “falsidade” e da “prepotência”. Mas vale pena aventurar-se na proposta evangélica do Filho de Deus: “felizes” são aqueles que “são mais”, que “servem mais”, que “amam mais”, que tem “fome e a sede de justiça”, que são “misericordiosos”, “puros de coração”, “promotores da paz”... tudo isso sem medo da “perseguição por causa da justiça”.
Tempo de pandemia também é tempo de perguntar-se: QUEM SÃO OS FELIZES?
Dom Jacinto Bergmann, arcebispo da Igreja Católica de Pelotas