“Aí a gente se dá por conta de que é capaz”, constatou M.S., 56 anos, ao segurar com firmeza a linha e a agulha, arrematando a gola de uma blusa. As flores aplicadas, rendas, desenhos e bordados vão dando um toque novo àquilo que antes parecia velho. Transformando uma situação nebulosa em um novo tom colorido de vida. A criatividade e o companheirismo são a força das 13 usuárias do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS Escola) da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) que participam da Oficina de Moda promovida pela entidade.
O ateliê ganha vida às terças-feiras, quando a aluna do 6º semestre do curso de Tecnologia em Design de Moda da UCPel, Márcia Belani, dá dicas e orienta as participantes do CAPS.
O sorriso tímido no rosto não esconde: é um afazer que dá gosto. Costureira apenas de peças básicas, M.S. agora solta a criatividade para superar a depressão que a trouxe ao local. “Isso é para trabalhar a mente da gente. Hoje estou 90% melhor do que quando cheguei. Posso dizer, porque sei como estava”, disse. O tempo que passava apenas dormindo ou chorando hoje ela transforma em um momento de convivência e criatividade. “[A oficina] me ajudou bastante. Fiquei mais esquecida das preocupações e estou mais esperta”, afirmou. O companheirismo e as horas divididas com as colegas da atividade foram o que M.S. mais destacou. “Aprendemos a conviver e perceber que não é só a gente que tem problemas. E, às vezes, os outros têm problemas até piores do que os nossos. Então, a gente está se ajudando”, contou.
Para as passarelas
M.L., 42 anos, nem gostava de costura. Agora, já tem peças prontas para desfilar na próxima terça-feira (20), quando o CAPS organiza a Festa de Dia do Amigo. “Fui fazendo com carinho, com o incentivo da professora e o coleguismo do grupo”, afirmou. Para ela, o importante é desmistificar o preconceito que existe muitas vezes em relação aos trabalhos do CAPS. “Aqui produzimos coisas legais. A gente tem descobertas. Descobrimos que podemos criar”, pontuou.
Durante a festa, o grupo apresentará as peças que foram customizadas – transformadas, mas sem mudar o estilo original. “Tornam-se peças únicas”, destaca a estagiária Márcia.
Estêncil (moldes vazados utilizados para pintar), aplicação de tecido, pérolas, flores em tecido, rendas, fitas e botões são alguns dos “exercícios” pelos quais as alunas passam na oficina. A ideia, segundo Márcia, é futuramente criar uma grife com as produções das usuárias do serviço.
Socialização
A psicóloga e coordenadora do CAPS Escola, Valéria Nogueira, explica que a Oficina de Moda tem objetivo terapêutico como todas as atividades desenvolvidas no local. No entanto, alia geração de renda, produção, criatividade e busca a autonomia do sujeito e a inclusão social.
Para ela, o resgate da vaidade – que muitas podem perder em função da depressão - é visível desde o início da Oficina. “Elas se relacionam, se sentem capazes. Se arrumam mais. A gente notou rapidamente como mexeu com a auto-estima delas”, avaliou a psicóloga.
Verba
O grupo está aguardando verba de R$ 5 mil do governo federal, conquistada por meio de seleção de projetos de arte, cultura e renda na Rede de Saúde Mental. Em Pelotas, apenas o CAPS Escola e o grupo Reabilitação, Trabalho e Arte (Retrate) foram contemplados. O valor foi liberado em fevereiro, e está em fase de licitação. A Oficina de Moda do CAPS Escola está no aguardo de máquinas de costura doméstica e overlock, busto de manequim, araras, revistas de moda, ferros e mesa de passar roupa. Além disso, a verba também será destinada a cursos de aperfeiçoamento e elaboração de material publicitário para divulgação da marca a ser criada pelas usuárias.
O atendimento no CAPS Escola é viabilizado em parceria entre UCPel e Secretaria Municipal de Saúde.