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Artigo: Existe um neo-hedonismo?
10.03.2023 | 16:49 | #capelania-e-identidade-crista
Artigo: Existe um neo-hedonismo?

O prazer pelo prazer ou a satisfação dos sentidos foi, desde sempre, a saída mais comum,seguida pelo vulgo, para responder a busca da felicidade ou do sentido último da vida. Contudo,tal solução tornou-se, nos tempos atuais, um verdadeiro "evangelho", uma efetiva"mensagemdemassa". De fato, a sociedade pós-moderna faz do prazer pelo prazer o ideal de civilização. 

Trata-se de um ideal que se adequa bem à filosofia geral de nossa época: os subjetivismo e consequente relativismo, que tende normalmente ao hedonismo. Com efeito, quando não existem valores absolutos e só relativos, a decisão acerca dos valores fica entregue ao sujeito, quer isolado, quando se trata da vida privada, quer associado, quando se trata da vida pública. Ora,quando é o sujeito que somente decide, tenderá a fazê-lo em função do que for mais fácil e cômodo para ele. E essa é precisamente a tentação do neo-hedonismo. 

Em extrema síntese histórica, seguindo o pensador cristão, Clodovis Boff, poderíamos dizer que"a ‘cornucópia permissiva’ do neo-hedonismo começou pelos anos 20 nos Estados Unidos da América, lá chegou ao apogeu nos anos 60 e espalhou-se, em seguida, pelo mundo como way of life globalizante graças à expansão do capital e mercado livres. Nos dias de hoje, economia capital e do mercado, através das técnicas do marketing, divulga pelo mundo o ‘evangélico do capital e da mercadoria’, prometendo o paraíso das delícias”. É, no jargão dos jovens, a "era do barato" no duplo sentido: de que tudo é a baixo preço e de que tudo é "curtição". 

Assim, o neo-hedonismo representa hoje a grande "boa-nova" que a propaganda dirige às massas, ou, mais precisamente ao "homem-massa", segundo o pensador J. Ortega Y Gasset. O nome mais preciso do hedonismo atual seria "sensual-materialismo", porque apela, quer para o ventre: é o consumismo; quer para o baixo-ventre: é o permissivismo sexual. 

Em tempos de "turbo", acelerando freneticamente todos os processos, o prazer pelo prazer tem que ser "p’rá já". Na análise do sociólogo, G. Schulze, vivemos uma "sociedade do prazer instantâneo e rápido". 

Ademais, a busca do prazer pelo prazer é hoje mais refinada que no passado. Os objetos do desejo são mais estéticos e sofisticados. Graças às técnicas do design, a mercadoriatorna-seumfetiche mais sedutor. Igualmente, o corpo ganha mais erotismo, em virtude dos mais variados meios de estetização. 

O neo-hedonismo acaba assim constituindo uma verdadeira ideologia, que vê a vida como fruição muito mais que como criação. Tal ideologia já penetrou e continua penetrando nossa cultura hodierna. Mexe mesmo com o conceito de "felicidade": felicidade torna-se sinônimo de"facilidade" - prazer pelo prazer. E felicidade não é isso! A felicidade sempre foi e sempre será criação do sentido maior que alcance o prazer divino em nós. 

O neo-hedonismo existe, sim! Já não é hora de enfrentá-lo de frente, tirando-lhe a ilusão de nos proporcionar o sentido verdadeiro da vida? 

Dom Jacinto Bergmann, arcebispo metropolitano da Igreja Católica de Pelotas

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