O dia sete de maio de 2024 jamais vai ser esquecido pela jornalista Juliana Loureiro e a filha Sofia, de 11 anos. Após assistir a uma live da Prefeitura sobre a possibilidade de enchente em Pelotas e ver o bairro onde moram apontado como zona de risco para alagamentos, as duas atenderam à recomendação oficial: deixaram a casa onde vivem. As primeiras perguntas feitas pela pré-adolescente à mãe foram a tônica dos dias que viriam a seguir: - “vamos perder toda a nossa
casa? Podemos morrer?”. São perguntas como estas que muitas famílias estão tendo que responder para crianças e adolescentes, atingidos ou não, pelas enchentes que transformaram a vida de milhares de gaúchos. Para especialistas em Psicologia as respostas para momentos em que os temas são tragédias e desastres estão em conversas francas, mas cuidadosas, com os pequenos que podem, dependendo do caso, ser estimulados a realizar atos de solidariedade para com o outro.
Juliana fez as malas, tentou proteger a moradia com sacos de areia, buscou abrigo na casa da família e tem conversado, diariamente, com Sofia. O comportamento da mãe integra a lista de orientações apontadas pela professora do curso de Psicologia da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), mestre em Saúde e Comportamento, Andrea Veiga Wagner. Segundo a docente, crianças e adolescentes que estiveram diretamente envolvidos com tragédias, podem perder suas referências, como a casa, a escola, parentes e, experimentam o sentimento de luto. “Em alguns casos o que é experimentado pode naturalmente ser resolvido com a vivência do processo de retomada da vida, em outros, pode se tornar algo crônico que precisará de suporte profissional”, explica.
Como abordar o tema
Mas pequenas, porém importantes ações já podem ajudar pais e cuidadores ao abordar essa temática tão incomum. Além da conversa embasada em informações verdadeiras, professora Andrea ainda lista outra ações, como por exemplo:
- adaptar a conversa para a idade e ao nível de compreensão da criança;
- questionar se a criança sabe o que está acontecendo;
- dependendo da idade, explicar o que está acontecendo através de imagens - como o uso de desenho simples para a compreensão da realidade;
- proporcionar momentos para reflexão, legitimando os pensamentos e o que a criança/adolescente tem a comunicar;
- deixar a criança/adolescente expressar as suas emoções - está tudo bem em sentir medo, tristeza;
- observar possíveis mudanças nos comportamentos das crianças/adolescentes - regressão, medos de trovão, de chuvas, dores físicas; e,
- supervisionar, e até mesmo, filtrar as notícias que a criança assiste.
Empatia e solidariedade
Se há meninos e meninas que são vítimas diretas das tragédias e desastres, há também aqueles que sofrem o abalo emocional pela iminência da calamidade, mas devido a forma como são orientados e cuidados, podem desenvolver a empatia e a solidariedade, salienta a professora da UCPel. “Cabe aos cuidadores, envolver as crianças e adolescentes em campanhas de doação ou voluntariado, por exemplo”, sugere Andrea Wagner. Foi o que Juliana fez ao encorajar Sofia a doar ração para os animais acolhidos no Esporte Clube Pelotas e a acompanhá-la na entrega de roupas e alimentos em abrigos da cidade. “ Era preciso que ela visse a situação de perto para entender o que estava acontecendo, gostou da experiência, mas demonstrou tristeza ao ver as pessoas nos abrigos”, relata a mãe, que já voltou com a filha para casa, mas que vive em permanente alerta.
Redação Alessandra Senna